A menina Mahkenzee Kennedy de Oklahoma (EUA), hoje com doze anos anos, sofreu bullying desde a Educação Infantil por ser gordinha. Aos nove, ficou famosa ao lançar campanha contra o bullying em sua escola. Será que a direção, o staff pedagógico e os professores fizeram o suficiente para proteger a menina?
Muitas crianças muito afora chegam psicologicamente sadias à escola, mas em vez de encontrar nela as condições necessárias ao pleno desenvolvimento de suas capacidades, são ofendidas moral e até fisicamente, por vezes com a participação e/ou a omissão dos profissionais da Educação, que têm a responsabilidade de proteger e promover a sua integridade.
O filósofo alemão Axel Honneth (Essen, 1949) apontou o desafio que as crianças enfrentam ao sair da zona de conforto do espaço doméstico para o convívio mais desafiador do espaço público, que inclui a escola. É uma transição inevitável e absolutamente imprescindível à maturação da criança. Contudo, sem o devido acompanhamento dos pais e profissionais da Educação, a vida escolar pode ser uma experiência predominantemente negativa.
A primeira obrigação dos pais e dos profissionais da Educação em relação às crianças na fase inicial de escolarização e conhecer e levar em consideração as vulnerabilidade desses infantes. São pessoas ainda em processo preliminar de formação, que não sabem se defender sozinhas. É preciso achar o ponto de equilíbrio entre o extremo da superproteção de um lado e o extremo do absenteísmo do outro.
A segunda obrigação dos pais e profissionais da Educação é preparar a própria criança para os desafios da complexidade do ambiente escolar. A construção das linhas de defesa dos pequenos de dentro para fora envolve o diálogo constante, o reforço da autoestima, a antecipação dos cenários futuros e a indicação de estratégias para contornar e superar as dificuldades típicas do processo de socialização escolar.
Honneth, com base nos estudos de Georg Wilhelm Friedrich Hegel (Estugarda, 1770 – Berlim, 1831), enfatiza a importância da afetividade reveladora de respeito e amor no curso processo de formação e de consolidação da personalidade das crianças a partir das relações de afetividade com a mãe, o pai, os irmãos e parentes mais próximos.
Caso esse processo seja bem-sucedido, o infante vai estar pronto para o próximo estágio de desenvolvimento psicointelectual, que é a escolarização. Essa passagem, porém, não pode ser uma ruptura, mas uma gradação, o que significa que nos primeiros anos de escolarização os pequenos precisam perceber dos profissionais da Educação e de seus coleguinhas do espaço acadêmico sentimentos positivos que denotem respeito e amor.
Por fim, a terceira obrigação dos pais e dos profissionais da Educação com relação às crianças na fase inicial da escolarização é a construção de linhas de defesa de fora para dentro. Uma das medidas necessárias é reduzir a exposição da criança a pessoas negativas, que descarregam suas frustrações ou compensam seus problemas de autoestima por meio de agressões verbais e até físicas contra os outros.
Nesse tópico, ressalta-se a responsabilidade dos profissionais da Educação incumbidos da escolarização do infante, os quais têm a obrigação de conformar e disciplinar, na medida do possível, a conduta do universo dos discentes que compartilham o espaço da escola.
O grande problema aqui é que, na maioria das vezes, as crianças com problemas de comportamento apresentam defasagem no processo de educação do estágio anterior à escolarização, que ocorre no seio da família. A escola não tem a obrigação de suprir lacunas de formação originadas no espaço doméstico. A solução aqui não é os profissionais da Educação lavarem as mãos, mas buscarem o envolvimento dos pais e acionarem apoio especializado a ser custeado pela família ou pelo Estado, conforme o caso.
Edvaldo Fernandes da Silva
Pós-Doutorando em Ciência Política, Doutor em Sociologia, Mestre em Ciência Política, jornalista, advogado, professor de Educação Básica (1991-1996), professor universitário e cofundador da Rede Pedagógica.
Referências:
HEGEL, G. W. F. System der Sittlichkeit. Ed. Georg Lasson. Hamburg: Meiner, 1967.
HONNETH, Axel. The Struggle for Recognition: The Moral Grammar of Social Conflicts. Trad. Joel. Anderson. Cambridge: The MIT Press, 1996.
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